Por Juliano Perozzo
Expedição – Bolívia 2014
20-07-2014 (Domingo) No aeroporto de Porto Alegre ou de Sampa, rasgou a capa da mochila porque o bastão e o piolet estavam desprotegidos. Juan, o diretor da Azimute Explorer, nos recebeu no Aeroporto em El Alto (4100m), cidade vizinha a La Paz (3700m), Capital. Conduziu-nos ao Hotel Eva Palace. Jantamos nas redondezas, uma comida indiana com muita pimenta e chapati e uma Pacena (cerveja local).
21-07-2014 (Segunda) Juan nos deu uma aula de história do povo Tiwanaku 1500 ac a 1430 dc. Os Aymarás destruíram os Tiwanaku. Os Quechuas se juntaram aos “Incas” e destruíram os Aymarás. A civilização ou política Inca durou 95 anos. Foram destruídos pelos espanhóis. Mas, antes, todas as riquezas culturais foram escondidas na Amazônia e no Lago Titicaca. Fiquei em êxtase (talvez a história não seja bem assim). Reinaldo foi o guia que nos conduziu a Tiwanaku. Laha, antiga La Paz de 1548. Sua Igreja foi construída com pedras de Tiwanaku. Almoço tri bom com bife de lhama. Dormi no ônibus de volta a La Paz. As 19h tivemos um papo com o Juan sobre os detalhes da expedição. Pagamos o restante do curso. Janta: Ravioli e suco de laranja. Meu nariz sangrou. Muita poeira no ar, além da altitude. Tomei um dorflex. La Paz, muito rica em cultura mas muita pobreza, morros repletos de casas sem pintura. Carros velhos. Cholas (senhoras índias típicas) com roupas coloridas. Bancas de vendas de qualquer coisa por todos os lados.
22-07-2014 (Terça) Uma hora esperando o ônibus. Micro terrível e lotado. Fomos para o Vale de La Luna. Muito legal. Depois, mais duas horas de ônibus para Chacaltaya, uma montanha de 5400m. Nos deixaram bem abaixo do pretendido que era o refúgio Clube Andino Boliviano, devido a neve que cobriu a estrada e o ônibus não avançava mais. A guia, Tereza, nos deu pouco tempo para caminhar mas conseguimos chegar aos 5 mil metros e forçar a aclimatação. Na volta uma turista passou mal pela altitude. Um grupo de italianas ofereceu folhas de coca a ela. Acabei pedindo um pouco. Amorteceu a boca. De volta ao hotel, as 18h tivemos uma reunião com o Cecílio Daza, nosso guia para o Curso de Escalada em Gelo e Neve nos Andes da Bolívia, mais especificamente no Maciço do Condoriri. Jantamos no Little Italy, bife com quinua (mais ou menos). Arrumamos as mochilas. Contato com a “gata” via Face e dormir. O Sandrinho vomitou a noite inteira (malditos pepinos, e o Mauro avisou…)
23-07-2014 (Quarta). Saímos as 09h do hotel, numa Van, cena de filme, bagageiro lotado de coisas e por fim, bem amarrado. Passamos por El Alto e logo começamos a tomar rumo tendo a nossa frente o Huayana Potosi. De repente surgiu imponente, o Cabeça de Condor, lindo, das mais imponentes do Condoriri. Descemos da Van, o cozinheiro Nemésio, nos ofereceu uma massa e um suco, prontamente aceitamos. Saímos para a caminhada enquanto os muleiros e o Nemésio arrumavam as coisas nas mulas. O motorista da Van estava gripado, parecia um zumbi. Já no início da caminhada o Sandro vomitou de novo. O Mauro ministrou alguns remédios e seguimos com Cecílio. No início para a subida para as lagunas encontramos um gurizinho nativo, uns 4 anos, chorando e ele foi nos seguindo. Assustados com a possibilidade do guri se machucar fiz gestos bem convincentes para ele voltar, com tom de voz bem firme. Ele começou a voltar, alívio geral. Ele nem falava espanhol, só aymará. Passamos por duas lagunas fantásticas, lindas e geladas, onde lavei a cara, lembrando de um gesto da Nítia, tipo, pedindo a benção. Numa trilha mais acima passavam nossas mulas com as bagagens. No percurso iniciei um papo com um guia local e seus clientes alemães e americanos. Maldito papo sobre a Copa. Chegamos ao acampamento, que beleza, tudo montado, barracas, cozinha, refeitório. Coisas que só vivi em livros. Arrumamos a cama para o Sandro que capotou na hora. Mostramos os equipos técnicos ao Cecílio e fomos jantar. As 18h, tentei o n2 mas não rolou. 19h, todos na cama e eu forçando a barra para o Sandro se hidratar. Noite fria e longa, acordei 200 vezes. Levantei para ir ao toalete mas nada rolou. Tentei bater foto do céu estrelado mas não consegui. Estava lindo. O Sandro mijava numa Pet dentro da barraca. Eu esvaziava a Pet a uns 15m da barraca e voltava, na tentativa de ajudar o cara, meu companheiro de barraca e possivelmente de corda. Acordei mais 200 vezes, assoei o nariz, que sangrou novamente, cada vez mais. 1ª noite a 4500m não foi fácil. Comecei a escrever, ouvindo os passos de alguns andinistas e o zíper de alguma barraca, na tentativa de passar o tempo e talvez me dar sono e dormir um pouco mais mas, não via a hora de amanhecer. E dá-lhe peidos.
24-07-2014 (Quinta) Sr. Idelfonso, nativo, nos vendeu algumas luvas, gorros e meias, bem legal. Saímos as 09h para a primeira aula do curso. O Sandro ficou no acampa melhorando. Quase duas horas de caminhada até a base do glaciar. Aprendemos como colocar os grampões facilmente. Técnicas de encordoamento, com nós nas pontas, e mosquetões duplos no meio, deixando sobra de corda a tira colo.
Deslocamento no glaciar, normalmente em diagonal. Como posicionar os pés, dependendo da inclinação. Técnica francesa, cruzando um pé ao lado do outro. Técnica mista, um pé de frente e outro de lado. Para subir reto acima, passo de pato, com os pés levemente abertos. Com mais de 55 graus de inclinação pode subir reto com as pontas dos grampões. Fizemos as reuniões com os parafusos de gelo e o abalacov (cordelete em furo no gelo) e backup no parafuso. Técnicas de guiada, utilização de parafusos em 60/70 graus. Como fixar o parafuso quando está guiando. Fazer um nó de aproximadamente 30cm para os que estão no meio da corda. Em trechos muito lisos ou pendentes fortes estica os 50m, monta a parada e recupera o segundo. Em 30 graus uma distância de 3m um do outro. Num glaciar longo pode esticar até 10m um do outro. Voltamos ao acampa no final da tarde, o Sandro estava deitado e disse que tomou 2 litros de água. As 19h rolou a janta e o Sandro comeu junto com a gente e em seguida foi para a barraca. Eu fiquei batendo papo com o Cecílio até as 22h. Aula de Aymara: Wara wara=estrelas; P’hajsi=lua; Inti=sol; Tata=pai; Mama=mãe; Pacha=terra. Fui dormir. No meio da madruga o Sandro levantou, estava meio tonto, não conseguia se equilibrar direito para beber água, dei uma ajudinha. Em seguida saiu da barraca para mijar, meio cambaleando, e logo voltou e deitou. Logo depois começou a ventar e choveu, melhor, nevou. Devido ao tamanho dos flocos de neve fiz uma brincadeira com o Sandro e disse, está chovendo quinua e ri mas ele nem deu bola. Dormi.
25-07-2014 (Sexta) Olhei para o Sandro e me assustei, ele estava com uma cara de quem estava longe, fiz algumas perguntas e ele não respondeu. Falei com o Lucas, que já estava a fim de ir embora (não estava bem psicologicamente), que disse: – Eu baixo com o Sandro para La Paz. Em seguida o Mauro deu dexametazona para o Sandro (para o mau da altitude). Passou uns 15 minutos falamos com o Cecílio e resolvemos baixa-lo a La Paz. O Cecílio escalou uma montanha, o Pico Austria, sozinho, em 1h08min, para fazer uma ligação ao Juan para enviar um veículo para buscar o Sandro. Enquanto isso começamos a baixar o Sandro até o local onde chegava o carro. Eu e o Nemésio, nosso cozinheiro, começamos a carregar o Sandro, que vestia uma cadeirinha (dica valiosa do Mauro). O Lucas seguiu na frente carregando a mochila dele e do Mauro, com os pertences mais rápidos e um rádio. O Mauro, nos seguiu com uma mochila pequena do Sandro e outro rádio. Passado 1h e meia o Cecílio nos alcançou e passou a ajudar a carregar o Sandro e trouxe uma garrafa de oxigênio. Desci carregando a mochila do Cecílio com o oxigênio que era ministrado por 5 minutos a cada 15 minutos de caminhada. A cada respirada no oxigênio o Sandro melhorava um pouco e seguíamos descendo. Felizmente coincidiu de chegarmos na estrada junto com o Juan e a Van. Foi triste, doeu o coração e chorei, vendo o Sandro, com princípio de edema cerebral, todo descoordenado, acompanhado do Lucas e do Mauro, nosso médico expedicionário. Me senti abandonando meu amigo de mais de 25 anos. Voltei ao acampa com o Cecílio e o Nemésio. Não conseguia descansar, estava adrenado. Lembrei do Mauro me dizendo para escalar a montanha e da bandeira da ACM que o Lucas me deixou. Almoçamos as 15h. Agora a expedição era eu, o guia e o cozinheiro. Juam disse que voltaria no dia seguinte para dar notícias do Sandro. O Cecílio e eu arrumamos as mochilas dos 3 queras com os materiais que deixaram no acampa. Me vi sozinho e bateu uma deprê. Felizmente 2h depois chegou outra expedição para movimentar o local. Quando estamos ativos na montanha esquecemos de tudo mas, nos períodos de descanso, é aquela vontade de estar junto a quem amamos, Jianlise, ai que vontade de estar contigo e fazermos uma família, te amo! Agora estou aqui, sozinho na barraca, escrevendo no diário que ela me deu. Vou me encontrar com meus amigos na segunda feira em La Paz. Espero que o Sandro melhore e o Lucas se tranquilize com a Helena e a Isadora e possamos ir junto ao Huayana Potosi. Espero também que tenha êxito na escalada do Pequeno Alpamayo.
26-07-2014 (Sábado) Último dia de treinamento. Café as 08h e 08:30 o Juan chega com notícias do Sandro, que estava no hospital, estava melhorando mas que se o resgate demorasse mais poderia ser fatal. Ele ia fazer uma tomografia para ver se estava bom da cabeça. 09h saímos para as técnicas de resgate. Cada um amarrado na ponta da corda, com 10 a 15 braçadas de corda a tira colo e um oito duplo na corda e prende novamente na cadeirinha, agora através de um mosquetão no anel da cadeirinha. E também um anel de cordelete atado a corda através do nó prussik prendendo-o no anel da cadeirinha. Sempre controlando a distância com o companheiro com mais um chumaço de corda na mão. Na queda do colega numa greta, contém a queda com contrapeso, usando também os grampões e o piolet se necessário. Fixa um parafuso no gelo e clipa o mosquetão do cordelete que está preso à corda, no parafuso fixado, então se liberando parcialmente da vítima. Bota mais um parafuso e monta uma parada mais acima do cordelete e monta um sistema de polia 3×1. Mantendo-se sempre preso à parada mas com certa flexibilidade. Pode montar um nó coração na parada de modo que haja um sistema anti-retorno (podendo tirar o cordelete) e podendo alongar ao máximo o sistema 3×1 ou, deixa o cordelete blocante e trabalha com sistema de polia mais curto. Outra situação praticada foi, após descer assistido, num parafuso, numa greta, e subir pelo outro lado da greta, colocando outro parafuso, tipo guiando, chegando ao topo da greta, na parte horizontal, e montando uma parada. Aí recolhe o companheiro e caso ele não consiga, passa a corda num nó coração, na parada, lança uma barriga da sequência da corda para o companheiro clipar com um mosquetão na sua cadeirinha, criando um sistema 2×1 anti retorno ajudando o companheiro a subir. Voltamos ao acampamento as 15:30h e Nemésio fez uma torada americana pra gente. Descansei um pouco, arrumei os equipos, troquei a roupa e as 18:30 jantamos. Emprestei a minha lanterna reserva ao Cecílio, a dele estava quebrada. Ele me mostrou a apostila do curso que ele fez, com todas as técnicas que realizamos e muitas outras. Bom, hora de me organizar para dormir pois amanhã é ataque ao cume as 04h e levantar as 03h. Uma curtida nas estrelas e o diário.
27-07-2014 (Domingo) Fui dormir as 21h de sexta, botei para despertar as 03h. Acordei meia noite, as duas e as 02:30h, depois não dormi mais. O café ia ser as 03:20h. Arrumei minha mochila para o ataque ao cume. Só faltava o chá quente. As 03:20 bati na barraca do cozinheiro pedindo água quente, ele ainda estava no saco de dormir mas já tinha água. Fiz meu chá e fiquei aguardando o guia para tomarmos café e partirmos para a montanha. Saímos as 04:30h e as 05:45 chegamos na base do glaciar. No caminho vi dois meteoritos cruzando o céu e pedi êxito na escalada e saúde ao Sandro. Nos equipamos e iniciamos a subida. As 06:45 amanheceu e desligamos as lanternas. Glaciar longo e forte, passamos muitas gretas, as pequenas dava para pular, as grandes, contornar, sempre encordados. As 09h já estava exausto. As 10h chegamos no cume do Tarija, +- 5200m, bem legal, e me emocionei ao ver o Pequeno Alpamaio, é lindo, de cinema. Almocei no Tarija. O acesso ao Pequeno passa por uma desescalada de primeiro grau de mais de 50m, bem exposta, assim como o acesso ao Tarija, que passa por uma greta em um desfiladeiro, a 30m do cume. Tira grampom, desescala, bota grampom e entra na aresta espetacular. O Cecílio guiou todas as partes difíceis, colocou quatro parafusos de gelo no percurso, me deu segurança nos crux (trechos mais difíceis) e o resto seguíamos a francesa, escalando juntos. Eu estava acabado e o Cecílio tinha que ter paciência comigo, minha resistência já era. Chegamos no cume as 11:30h. Morri por alguns segundos, comi uma bergamota e melhorei um pouco. Bati umas fotos fiz um vídeo pedindo a Jianlise em casamento e mais umas fotos com a bandeira da ACM. Bastante vento. Baixamos rapidamente do Pequeno Alpamayo mas na subida para o Tarija fiquei extenuado novamente. Nem na descida do glaciar do Tarija aliviava, eu tinha que parar para descansar, quase dormia. Chegamos no acampa as 15:30. Foram 11h de fadiga. Ao chegar me pediram se havia conseguido e fiz um gesto que sim e me aplaudiram, fiquei sem saber o que fazer e agradeci. Troquei a roupa por outra suja, comi um lanche, tomei um chá e um café e descansei um pouco. As 18h janta e fui para a barraca, com dor de cabeça, arrumar a mochila para ir a La Paz amanhã e me encontrar com os amigos no hotel. Essa montanha é muito linda mesmo mas estava tão exausto que não consegui curtir o quanto gostaria, vou ver melhor depois nas fotos. Abraço.
28-07-2014 (Segunda) Acordei as 07:30h, café. Entregar as coisas para os muleiros. Comecei a descida sozinho. Parei ao lado da lagoa e fiz uma oração. Em seguida vi uma avalanche e consegui fotografar. Encontrei Roberto (um senhor nativo) no caminho, batemos um papo, ele disse – Vivo de las lhamas y del turismo. Segui a caminhada. Chorei. Chorei na entrada e na saída do Condoriri. Mais uma vez a montanha me coloca no devido lugar. Chorando por coisas tão simples, é que percebemos que temos um barril de ouro ao nosso lado. Jianlise, te amo, espero que esteja sentindo isso. Logo vou te falar pessoalmente. Por um momento , na descida para a estrada, pensei ter visto o Lucas e o Sandrinho vindo me encontrar. 5 minutos depois que cheguei na estrada chegou a Van, com o motorista zumbi, uma parada! Cheguei no hotel, a galera me recebeu e o Sandro estava bem mas tinha que sair da altitude de La Paz. Ele e o Lucas vão para o Brasil amanhã de manhã. Eu e o Mauro vamos para o Huayana quarta de manhã. No almoço (16h) comi um lanche Alpinista, ao lado do hotel, e o Mauro um sorvete, se curando da diarreia. Mais tarde, fomos o Sandro, o Lucas e eu jantar no Stick House. O Mauro ficou no hotel comendo batata frita. Na janta, meu chorizo de lhama virou salsichão de frango e a salada era 1 folha de alface e 1 rodela de tomate (frutas e verduras eram meio escassas por lá). Voltamos ao hotel. O Mauro e eu num quarto e o Sandro e o Lucas noutro, já que saiam as 4h da manhã.
29-07-2014 (Terça) Acordamos tranquilamente as 8h, café e fomos visitar a igreja de São Francisco, gigante, cheia de adornos em ouro e espelhos “para que os índios saibam que estão sendo observados por Deus”, cada coisa! A presença de turistas aqui é gigante, principalmente europeus, muitos casais mochileiros, de cabelos claros. Seguimos passeando pela Calle de Las Bruxas. Se vende de tudo: folhas de coca, unhas de lhama, ponchos, chapéus, roupas, fetos de lhama, fósseis, incensos, coisas para mandingas, tecidos, equipos esportivos, agências de turismo, albergues, cafés, restaurantes, tudo um ao lado do outro. O Mauro e eu fizemos as compras e voltamos ao hotel arrumar parte das coisas para amanhã. A esta hora (17:30 no Brasil) os guris devem estar chegando em Porto Alegre. A noite, fomos comer uma pizza no Ellis (rede de pizzaria local), depois seguimos caminhando por “trilha” circular pelo centro de La Paz, muita gente, passado e presente misturados num kaos auto-organizado. Um Blade Runner fascinante, uma energia acolhedora num ambiente relativamente “hostil” (altiplano boliviano).
30-07-2014 (Quarta). Café, coisas na mochila, devolver materiais alugados pelos guris para o Juan e com o Michael Jackson (motora zumbi) e o Nemésio fomos para Huayana Potosi. As 13h chegamos no refúgio, almoço, chá e fomos dar uma caminhada pelo local, avistar o refúgio alto e ver parte do caminho. Café da tarde, muito cha com biscoito. Saí para dar uma volta para fumar um palheiro, que feio, ainda mais pela altitude. De repente comecei a ouvir um zumbido e pensei, não devia ter fumado e fui voltando ao refúgio e o zumbido começou a diminuir, bah, eu estava de baixo de uma rede de alta tensão, que alívio. Bom, estou aqui no refúgio, no dormitório, 2 dormindo, 3 americanos jogando xadrez, o Mauro roncando alto e eu ouvindo som do celular e escrevendo o diário de bordo, são 21:30h.
31-07-2014 (Quinta). Devido a relativa complicação na logística de expedições, subimos ao refúgio alto só as 11h, deixando algumas coisas nossas ali embaixo. Tivemos o apoio de um guia principal, Irineo Aruquipa (dente de ouro), um guia auxiliar (Nemésio, que também era nosso cozinheiro) e um porteador, Samuel, também dente de ouro. Levamos 3 horas para chegar ao refúgio alto.Trilha bem íngreme com trechos de escalada de primeiro grau, rocha com neve, e cordas fixas. Bem perto do refúgio o Mauro teve uma queda na trilha, bem controlada, mas acabou batendo o joelho, que o preocupou. Por volta de 15h almoçamos e as 17:30 a janta, porque depois era descansar para o ataque. O Mauro botou gelo no joelho para desinchar e continuava doendo. Acabou tomando a sábia decisão de interromper sua subida pois, se a situação do joelho piorasse, um resgate seria bem mais complicado que a situação do Sandro pois a trilha aqui no Huayana era bem pior. Infelizmente seguiria sozinho novamente.
01-08-2014 (Sexta). Acordamos a meia noite, arrumamos as coisas, tomei dois cafés e partimos a uma da manhã, com as head lamps sobre o glaciar. Passamos cerca de 6 gretas, sempre encordados, o Irineo e eu. Como era noite, não sacava muito bem o percurso e ainda era lua nova. Estrelas tinham bastante. Em alguns trechos víamos as luzes de El Alto, bem bonito ao longe mas, uma cidade pobre de casas simples sem pintura, sem calçada e assim como La Paz, muito pó. Praticamente seguíamos as marcas no gelo do glaciar e aos poucos as outras equipes iam se aproximando da gente e algumas passando. Gente do mundo inteiro. Umas 15 pessoas no ataque. As 6h da manhã já conseguia ver a silhueta do cume ou o que achava que era o cume. Bem técnica, misturando trechos de escalada mista, rocha e gelo, usando grampões e piolet. Realmente tinha que confiar no piolet e sua fixação no gelo. Havia uma corda entre nós mas nenhuma proteção, apesar do guia ter consigo parafusos de gelo. Apesar da aresta ser bem estreita tínhamos que dar lado para um grupo que estava descendo. O sol nasceu, iluminando toda a face da montanha, tornando especial a chegada ao topo. Muitas fotos, bandeira da ACM e vídeo pedindo minha garota em casamento (outro). Em seguida um chocolate e iniciamos a descida, com todo cuidado pela crista delicada. O retorno ao refúgio foi rápido, cerca de 2h onde pude realmente ver o caminho e as zonas de gretas, algumas gigantes. Chegamos ao refúgio as 09:15h e me sentia perdido pelos horários de saída do ataque. Ainda tinha que arrumar as coisas para o porteador, que estava esperando. Me deram uma chícara de chá, que bom. O Mauro havia descido ao refúgio baixo por um glaciar, desviando o trecho de escalada da trilha. Roubei um pedaço de bolo de alguém e tomei outro chá. No caminho de descida o Irineo me ofereceu um pedaço de charque de lhama que, bem salgado, me despertou um pouco. Cheguei ao refúgio baixo e encontrei o Mauro, que deu suas botas duplas ao Nemésio e eu minhas luvas técnicas BD. E 10 dólares como gratidão ao Irineo. Em seguida chega o Samuel com a mochila. Arrumamos as coisas e seguimos de Van a La Paz. Um descanso de uma hora e fomos jantar no restaurante cubano. Mais uma voltinha pela Calle de Las Bruxas e voltamos ao hotel. Papo com mi amor pelo Face e 09h já estava dormindo.
02-08-2014 (Sábado). Acordamos as 07h, diário, banho e café da manhã. Passeio pelo centro e almoço no Ângelo Colonial, cheio de adornos antigos, tomamos umas pacenas e já fiquei alegre. Mais uma visita no evento Entrada Universitária Folclórica, desfiles com danças e trajes típicos e música. Voltei ao hotel, arrumamos as mochilas bem direitinho para caber tudo. No final da tarde recebemos o Juan, se despedindo e entregando nossos certificados. Mais uma visita ao desfile e um daqueles animadores de plateia me “tirou para Cristo” foi engraçado. Depois lembrei que ele também tirou o Mauro alguns dias antes, bela histórias para rir. Jantamos no Pena Huari com cerveja de Huari, Oruro. Voltamos ao hotel e colocamos despertar para pegar o avião para o Brasil.
03-08-2014 (Domingo). Pegaram o Mauro na revista da bagagem e acabamos indo a Santa Cruz separados, depois nos encontramos novamente. Chegando em casa. Contando tudo.
04-08-2014 (Segunda). Visita ao Sandrinho. Fiquei bem mais tranquilo.
05-08-2014 Bah, dormi umas 3 horas a mais que o normal. Tri bom.
06-08-2014 Lavei o rosto na pia que bom que é. Começando a me recuperar.
… Juliano Perozzo
* Expedição realizada em julho de 2014 pelos associados Juliano Perozzo, Lucas Hainzenreder Longhi, Mauro Sérgio Belló Bertelli e Sandro César Dal Magro