A história do montanhismo

Nasceu o Montanhismo como esporte no último quartel de século XVIII, sob a denominação de “Alpinismo”, por ter começado na famosa cordilheira dos Alpes, em plena Europa Central. Foi portanto seu marco inicial a escalada ao ‘Mont Blanc’, no ano de 1786, considerada como o início da prática do chamado “Nobre Esporte das Alturas”, esporte que viria a ser praticado no Brasil com o nome de Montanhismo.

By Christian von Mechel – https://www.teylersmuseum.nl/nl/collectie/kunst/kg-16892-afdaling-van-de-mont-blanc-door-prof-de-saussure-1787, Public Domain, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=18316435

As Primeiras Escaladas no Século XIX

Nossa história registra a conquista de novas fronteiras, através de um ciclo de penetrações e explorações territoriais, iniciado no século XVII, principalmente pelos desbravamentos desenvolvidos por bandeirantes, que estenderam nossas fronteiras muito além do que fora determinado pelo Tratado de Tordesilhas. Nestas investidas, montanhas e picos elevados foram subidos por aqueles intrépidos conquistadores, cujos feitos chegam a ser confundidos com a lenda, sem que ficassem registradas tais ascensões. Foi somente no século XIX, que a crônica veio a registrar as primeiras subidas de montanhas, começando então a sua caracterização esportiva, embora ainda incipiente e com motivações várias. Já em 1828 eram registradas algumas subidas a Pedra da Gávea, fascinante montanha de 842 metros de altitude, onde um capricho da natureza esculpiu imponente efígie de traços humanos, cuja semelhança com o rosto do imperador D. Pedro II, lhe valeu a denominação de “Cabeça do Imperador”. Pseudo inscrições rupestres (caneluras geológicas), também fizeram atrair os doutos do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, levando o sábio Mestre Frei Custódio Alves Serrão, membro daquele Instituto, a subi-la a frente de um pequeno grupo, no ano de 1839. Em 1856 ocorre a primeira escalada com “Conquista” de montanha no Brasil, quando o cidadão José Franklin da Silva, morador da antiga Vila de Aiuruoca, movido por pioneirismo quase visionário, escala os imponentes paredões sulcados do Pico das Agulhas Negras, no Maciço de Itatiaia, atingindo então a maior altitude que um brasileiro já alcançara em nosso país: 2.787 metros de altitude. Para lá chegar, o solitário escalador venceu primeiro os pontões principais que antecedem os paredões, depois escalando aquelas muralhas rochosas, sulcadas pela erosão que formou suas caneluras, até alcançar o cume, vencendo uma calha perigosa e muitos abismos. O relato desta escalada foi enviado pelo nosso Montanhista-Pioneiro, à Corte, onde em palavras singelas narrou sobre o caminho que galgara, suas dificuldades e suas belezas, que destaca com entusiasmo e admiração. Em outros pontos do Brasil há narrativas de algumas subidas de montanhas, embora estas movidas por interesses científicos. Já em meados do século XIX, as montanhas do Maciço da Tijuca e de Jacarepaguá eram conhecidas e subidas pelos ruralistas do ciclo do café, daí surgindo suas denominações, a maioria das quais permanece até hoje. Temos a Pedra do Conde, assim denominada em homenagem ao Conde de Bonfim, um de seus proprietários, o Pico da Tijuca, o Pico do Papagaio, o Morro da Cocanha, a Pedra do Archer, a Pedra Feia (atual Pico do Andaraí Maior), o Pico do Morumbí (atual Pico do Perdido do Andaraí), também chamado erroneamente de Pico do Papagaio, no Grajaú, e ainda, o Morro do Elefante e o Pico do Tijuca-Mirím (também conhecido como Pedra Sete). Na Serra da Carioca, o Pico Carioca, o Morro Queimado, e o Pico do Corcovado, também já eram subidos, inclusive tendo uma comitiva da Corte, levado o Imperador D. Pedro II até os 704m de altitude do Corcovado, local onde extasiado pela beleza do panorama, o Imperador sugeriu que se melhorasse o caminho e ali fosse construído um mirante, o que foi feito prontamente. Outra escalada destacada foi a do Pico do Pão de Açúcar, com seus 395m de altitude, que no ano de 1871, foi subido pelo atual “Paredão do Costão”, por uma senhora inglesa, seu filho e mais umas pessoas não identificadas, que ao chegarem ao cume e alí hastearam a bandeira da Inglaterra. Tal feito, no entretanto, desencadeou um coletivo protesto por parte da antiga Escola Militar da Praia Vermelha, que tomados de brios e fervor patriótico, encetaram a escalada do Pico pelo mesmo caminho (“Costão”), e após cinco horas de escalada, lograram atingir o cume, levando o “ultraje” de um pavilhão estrangeiro hasteado sobre uma montanha do nosso território, substituindo-o incontinente pelas cores do pavilhão nacional. Foi porém no dia 21 de agosto de 1879, que pela primeira vez foi reunida em nosso país, uma equipe de “montanhistas”, tendo como finalidade única, realizar uma escalada de montanha sem outras mais motivações, à não ser apreciar seus panoramas e desfrutar das belezas e da satisfação de vencer as dificuldades que a Mãe-Natureza ali depositou. A glória deste feito é devida a um grupo de entusiastas paranaenses, que formando uma equipe composta por Joaquim Olímpio de Miranda, Bento Manuel Leão, Antônio Silva e Joaquim Messias, resolveram escalar a principal montanha da Serra do Marumbi, pico de mais de 1.500 m. de altitude. José Olímpio era o líder inconteste desta ascensão, e a frente de seus companheiros, rompeu através das matas que cercavam o pico, vencendo-as com denodo, galgando e grimpando sobre lajedos e rochas, até finalmente atingir aquelas alturas, de onde puderam ver o seu Paraná até perder de vista, verde o belo. Era a primeira escalada “esportiva” no Brasil, planejada e estudada, dentro de uma sistemática. Em homenagem ao líder, o pico foi denominado “Monte Olimpo”. No ano seguinte, confirmando sua vocação para o Montanhismo, José Olímpio de Miranda, liderando uma nova equipe de escaladores, dessa feita, composta por Antônio Pereira da Silva, José Antônio Teixeira, João Ferreira Gomes, Pedro Viriato de Souza, e os Capitães José Ribeiro de Macedo e Antônio Ribeiro de Macedo, que no dia 26 de agosto de 1880 atingiram o alto do Monte Olimpo novamente. Se não fundaram um primeiro Clube de Montanhismo no Brasil, aqueles paranaenses valentes se constituíram sem dúvida, no primeiro grupo de escaladores de montanhas com embrionária qualificação esportiva. Ainda no final do século XIX, temos novamente a escalada do elevado Pico das Agulhas Negras, até então considerado como a montanha mais alta do Brasil. Desta feita são os escaladores, Horácio de Carvalho e José Borba, que vencendo todas as dificuldades, percorrem o caminho pioneiro de José Franklin da Silva, desta vez, já aplicado artifícios técnicos rudimentares de escalada. A ascensão fora debaixo de frio intenso, enfrentando os escaladores um princípio de mau tempo, com fortes rajadas de vento, mas que não impediu de ambos chegarem ao almejado cume das Agulhas Negras. Algumas outras montanhas conhecidas também foram subidas no decorrer do século XIX, sem que se tenha uma notícia dos nomes de quem as galgaram. É o caso da Pedra Bonita, do Pico do Marapicú, do Morro da Boa Vista, do Morro do Medanha ou da pedra Branca, todos com caminhos de acesso abertos no século passado. Em outros estados, sabe-se por exemplo que o Pico do Jaraguá, em São Paulo, já tinha também sido subido por grupo paulista, sem que seus nomes tivessem sido anotados. Era o montanhismo que despontava pioneiramente para os brasileiros, e cuja a força máxima viria residir no Estado do Rio de Janeiro, no esplendor do século XX.

As Primeiras Escaladas no Século XX

No início do século XX houve grande avanço técnico no Montanhismo, em particular na escalada em rocha e gelo. As principais vertentes do Alpes foram escaladas e em 1938 a face norte do Eiger, uma das maiores paredes da Europa, é conquistada. No Brasil, em 1912, um grupo de Teresópolis, o ferreiro José Teixeira Guimarães, o caçador Raul Carneiro e os irmãos Acácio, Alexandre e Américo Oliveira, após muito planejamento e uma semana de investidas, atingem o cume do Dedo de Deus. Fato que é lembrado como marco do Montanhismo Nacional. Este ‘caminho’, hoje denominado ‘Teixeira’, é ainda utilizado para chegar ao cume. As décadas de 40 e 50 foram um período de grandes escaladas e grandes escaladores. Foi escalado o primeiro pico com mais de 8.000 metros de altitude, o Annapurna com 8.078 metros em 1950. O ´Teto do Mundo´ foi atingido, o Everest (8.848 metros) em 1953, pelo neozelandês Edmund Hillary e o sherpa Tensing Norkay. No ano seguinte o K-2, segunda montanha mais alta do mundo. Na Europa Walter Bonatti escala em solitário e no inverno a face norte do Cervino. No campo da escalada em rocha foram escalados o Half Dome (1957) e o El Capitan (1958), na Califórnia, com 800 e 1.000 metros de pura rocha vertical, respectivamente. Sem esquecer do Fitz-Roy na Patagônia argentina, escalado em 1952, por Lionel Terray e Guido Magnone. No Brasil foram escalados o Pico Maior de Friburgo, a Chaminé Rio de Janeiro na imponente face sul do Corcovado e a Chaminé Gallotti no Pão de Açúcar entre várias outras montanhas de igual beleza. Um dos escaladores que mais se destacou nesta época foi Sílvio Mendes. Finalmente, a partir da década de 60, se consolidou o montanhismo esportivo moderno. Com novas técnicas desenvolvidas, equipamentos avançados, treinamentos rigorosos e escaladas cada vez mais atléticas, grandes paredes foram vencidas, entre elas: a Torre Central del Paine (1963) e o Cerro Torre (1974), ambas na Patagônia. São escaladas vertentes cada vez mais difíceis em picos antes já atingidos. Reinhold Messner atinge o cume do Everest sem utilizar oxigênio engarrafado em 1978 e dois anos depois repete o feito, e desta vez, em solitário. Na década de 80 e 90 a escalada desportiva cresce no mundo todo e dificuldades extremas são superadas. Paredes gigantescas que eram antes escaladas em artificial são repetidas em livre. No Paquistão a Grande Trango Tower, talvez a maior parede de rocha do mundo, é escalada. É nesta incessante busca do desconhecido e de novos desafios que chegamos aos dias atuais.

Fontes de pesquisa:
Antiga Revista Montanha;
Apostila do CEB;
Revista Desnível;
“Os conquistadores do Inútil”

O texto é clipping do site de Davi Marsky – www.marsky.org

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