A ideia surgiu há alguns anos, porém não tínhamos know-how. Em março de 1997 (apresentado e aprovado pela Associação Caxiense de Montanhismo), tomamos a decisão: vamos escalar o Aconcágua.
O projeto começou com pesquisas na internet e consultas a colegas que já haviam estado no Aconcágua. Após intensas pesquisas, o projeto estava pronto, só precisávamos vendê-lo, o que seria o mais difícil. O projeto foi dividido em quatro cotas de 2.048.00 cada, e escolhemos a rota do Glaciar de Los Polacos para escalar o Aconcágua. Apresentamos o projeto a várias empresas de Caxias. Em junho, a Universidade de Caxias do Sul, por meio do projeto UCS Olimpíada 2004 (Alexandre Ziles, o barata), adquiriu uma das cotas e também iniciamos nossa preparação física com a ajuda do Didjo do Centro Esportivo Pranadar. Iniciamos o treinamento físico, cujo objetivo era aumentar a resistência aeróbia e anaeróbia. No começo, tínhamos duas horas de musculação (com a professora Cristiane) duas vezes por semana. Um mês depois, aumentamos para três vezes por semana e, em seguida, incluímos a natação (com o Rogério e a Andréa). Nesse período, realizamos um teste de resistência física e pulmonar com a professora Olga, na UCS. Estávamos a todo vapor. A busca por outros patrocinadores foi interrompida pela UCS, que tentou vender o projeto (incluindo a cobertura midiática com um repórter e um cinegrafista na expedição) para algumas grandes empresas. Sem sucesso, o projeto foi devolvido para nós em outubro, mas a UCS manteve uma das cotas. A venda do projeto tornou-se ainda mais difícil. Ao mesmo tempo, nosso treinamento estava perfeito, com natação e musculação de segunda a sexta-feira.
A dificuldade em vender o projeto foi superada apenas trinta dias antes da data de partida, o que resultou em algumas alterações no projeto original. A segunda cota foi vendida à Cia FIOFORTE, por meio do Sr. Flávio Busetti, e a rota de escalada foi alterada para Noroeste ou Normal, permitindo assim a realização do projeto com apenas duas cotas vendidas. No entanto, dessa forma, os apoiadores desempenharam um papel importante na expedição. Entre os apoiadores do projeto, o Scalco Laboratório Fotográfico foi responsável por fornecer filmes fotográficos, revelação, fotografias e slides, que constituíam grande parte do material de divulgação da expedição. Posteriormente, a Ananda Granola Caseira esteve presente em todos os cafés da manhã durante toda a expedição, juntamente com a Vitamed, que forneceu os complementos vitamínicos. A Sultextil forneceu tecidos para a confecção das camisetas, bem como tecidos para a primeira e segunda camadas de agasalho, feitos de Polipropileno e Algodão, respectivamente. A Belfibras forneceu material para a confecção da japona, que era um dos agasalhos mais confortáveis. A Flytour Viagens e Turismo nos forneceu carteiras de albergue da juventude internacional e cartões telefônicos internacionais. A Dinaço foi responsável pelo nosso seguro saúde. Outros apoiadores incluíram a Foca, Swim Brazil, Copitec e Posto São Luiz.
Em 15 de dezembro de 1997, partimos de Caxias do Sul (800m), Brasil, com destino a Mendoza (800m), na Argentina. Juliano e Marcelo passaram por Santa Fé e Paulo por Buenos Aires. Em 17 de dezembro, chegamos a Mendoza, onde passamos duas noites no Albergue Campo Base. Lá, compramos o restante do equipamento e obtivemos permissão para escalar o Aconcágua na Secretaria de Recursos Naturais Renováveis, no Parque Gen. San Martin. Também organizamos novamente nosso equipamento.
Em 19 de dezembro, chegamos a Puente del Inca, que está a 2700 metros acima do nível do mar. É uma vila de onde partem expedições ao Aconcágua e é uma importante base militar. Ficamos lá por três noites. Enviamos nossos mantimentos (para cerca de 25 dias) com Sebastian Tetilla, guia de alta montanha e contato para aluguel de mulas que faziam o transporte de carga (aproximadamente 90 kg). Os mantimentos consistiam principalmente de alimentos e equipamentos, e o custo era de 120 dólares para a primeira mula e 60 dólares para as seguintes. Cada mula carregava no máximo 60 kg até o acampamento-base em Plaza de Mulas. Ainda em Puente del Inca, subimos o Cerro Quebrada Blanca, com 4203m, iniciando assim a fase de aclimatação, e fizemos nosso último contato telefônico.
Em 22 de dezembro, entramos no Parque Provincial do Aconcágua, com dois dias para concluir a expedição. A partir da entrada do Parque, são 12 km até o primeiro acampamento chamado Confluência, a 3300m. Confluência é o local onde os rios Horcones Superior e Inferior se encontram, provenientes do Leste e do Oeste do Aconcágua. São de 3 a 4 horas de caminhada, já sentindo os efeitos da altitude. Considerado um oásis no deserto dos Andes Centrais, Confluência é ponto de partida para inúmeras caminhadas de aclimatação, como a base da parede sul do Cerro Almacenes, a base do Cerro Tolosa e outros cerros ao redor. Fizemos a caminhada até a base do Tolosa. O caminho, que começa com pequenas elevações, passa por um planalto e continua com blocos de rocha e penitentes (esculturas de gelo), até que em um campo de neve, a aproximadamente 4.000 metros, fomos surpreendidos por uma nuvem barulhenta vinda do oeste, o que nos fez reduzir o tempo que planejávamos passar na base. Então, retornamos a Confluência acompanhados por um grupo de suíços que haviam subido o Cerro “Mathias”. No início da noite, por volta das 21h30, a temperatura caiu e começou uma leve queda de neve, quase sempre acompanhada pelo vento. Ainda em Confluência, passamos o Natal na barraca do guarda-parque, junto com expedições de todo o mundo. Foi um grande encontro de miscigenação e troca de conhecimentos.
Em 25 de dezembro, partimos em direção a Plaza de Mulas, que está a 4.200 metros de altitude. Foi um trecho de aproximadamente 28 km, levemente inclinado, com vento contrário e tempo fechado, o que fez a temperatura cair bastante, especialmente na parte conhecida como Playa Ancha. Durante o percurso, pudemos observar algumas montanhas imponentes, incluindo o Cerro Tolosa, o Cerro México e o Cerro de los Dedos. Entre Plaza de Mulas Inferior e Superior (atual acampamento-base), há a Cuesta Brava, um trecho curto, mas com uma grande inclinação, que foi desafiador de superar. Passamos três noites em Plaza de Mulas, onde pudemos descansar. Construímos uma parede de pedra ao redor da barraca para nos proteger do vento, o que nos levou um dia. Consultamos a equipe médica disponível no acampamento-base e retiramos nossos equipamentos do depósito. Em Plaza de Mulas, também pudemos presenciar a força de uma avalanche em um dos glaciares do Cerro Cuerno, no ponto em que o vale de Horcones Inferior se fecha. Além do Cerro Cuerno, que está a 5.018 metros, ergue-se o Cerro Catedral a 5.295 metros, bem como o Cerro Bonete a 5.100 metros. Em 28 de dezembro, partimos de Plaza de Mulas seguindo o estilo himalaiano (subindo para levar parte do equipamento e voltando para dormir, e no dia seguinte subindo novamente com o restante e permanecendo lá, e assim por diante). Subimos até Plaza Canadá, que está a 4.950 metros. O trecho é bastante inclinado e o caminho é em zigue-zague. Deixamos parte do equipamento ao lado do acampamento de outra expedição de gaúchos e descemos novamente para a base em Plaza de Mulas. Durante a ascensão a Canadá, fomos novamente acompanhados pelo vento e baixas temperaturas. Em 29 de dezembro, o tempo estava extremamente ruim, com “El Hongo” aparecendo várias vezes e indicando as piores condições de escalada. Foi um dia dedicado ao descanso.
Em 30 de dezembro, era o aniversário de Marcelo, e ele estava altamente motivado para continuar a subida. Ele partiu antes de todos os outros membros da expedição. Paulo, por sua vez, foi ao médico e recebeu um diagnóstico desagradável: acúmulo de líquido nos pulmões. Isso o obrigou a permanecer no campo-base por mais dois dias. Juliano também consultou o médico, mas não foram constatados problemas graves. Juliano e Marcelo passaram a noite em Canadá, porém, devido aos fortes ventos de até 60 km/h, não conseguiram dormir, embora tenham testemunhado um pôr do sol incrível.
Em 31 de dezembro, após um contato por rádio e uma nova consulta médica, Paulo começou a subir em direção a Canadá, mas a 300 metros acima da base ele se sentiu mal e decidiu voltar. Marcelo e Juliano carregaram parte do equipamento até Nido de Condores. No final do dia, os membros da expedição se reuniram na base para comemorar a passagem de ano junto com outros montanhistas, aproveitando um clima bom sem vento.
Em 1º de janeiro de 1998, foi um dia de muita caminhada. Saindo de Plaza de Mulas, Juliano e Marcelo foram para Canadá, onde almoçaram, descansaram um pouco e seguiram para Nido de Condores, que está a 5.350 metros de altitude, onde acamparam. “A visão da face norte do Aconcágua é fantástica, bem diferente dos acampamentos mais baixos. O cume agora parecia estar bem mais próximo”.
Em 2 de janeiro, foi um dia de descanso, e passamos várias horas (mais de cinco) em frente ao fogareiro derretendo gelo, pois essa era a única forma de obter água. Nido de Condores é um platô de onde podíamos avistar muitas das montanhas que nos acompanharam ao longo da jornada, como o Cerro Cuerno, o Catedral e, ao fundo a leste, o Mercedário, com 6.770 metros. Tiramos muitas fotos do local.
Em 3 de janeiro, chegou o dia do ataque ao cume do Monte Aconcágua. Antônio, um montanhista acampado ao lado, acordou o grupo às 4h18min, pois era o único que possuía um relógio. Sair dos sacos de dormir não foi fácil devido à ansiedade. Por volta das 6h11min, a equipe partiu em direção ao refúgio Berlin, localizado a 5.800 metros de altitude, acompanhados de um amanhecer espetacular. Cada membro levou mochilas contendo 1,5 litros de água, uma jaqueta e algumas guloseimas e chocolates. A caminhada até Berlin levou cerca de 1 hora e 30 minutos. Em Berlin, havia três refúgios, mas dois deles estavam destruídos, restando apenas um com dimensões de 1,5 metros de altura por 1,5 metros de largura, feito de madeira no estilo canadense.
De Berlin, a equipe seguiu em direção a Independência, localizado a 6.100 metros de altitude, que era o último refúgio antes do cume. A caminhada até Independência levou cerca de 2 horas. Nesses pontos, era comum fazer uma pausa para beber água e comer um pouco. No entanto, Marcelo começou a sentir dores de cabeça leves. A partir de Independência, a equipe seguiu em direção ao Gran Acampamento, uma travessia extensa, chegando a cerca de 6.300 a 6.500 metros em direção à Canaleta. O final do Gran Acampamento e o início da Canaleta, localizado a 6.600 metros, era uma das partes mais difíceis. O terreno apresentava uma mudança brusca de inclinação, onde pedras de até meio metro rolavam facilmente, exigindo um esforço considerável para avançar. As dores de cabeça de Marcelo pioraram e ele precisou parar na entrada da Canaleta. Nesse ponto, eles também deixaram as mochilas para aliviar o peso e facilitar a escalada. Juliano decidiu continuar, relatando sua experiência: “Tentei escalar pelas pedras no início da Canaleta, mas estava muito difícil. Então desci um pouco e subi pela extremidade direita da Canaleta, onde havia uma camada de gelo com cerca de quatro metros de largura, rente à rocha e acima dela. Subi por essa camada de gelo e segui algumas pegadas já formadas por outros escaladores neste verão. Essa parte tornou-se um pouco mais fácil e continuei por mais uns 150 metros, mas parei, muito cansado e pensando em desistir, a apenas 150 metros do cume.” Nesse momento, um montanhista francês alcançou Juliano e compartilhou informações cruciais que o ajudaram a continuar a subida. As distâncias curtas pareciam ser percorridas de forma extremamente lenta. A altitude e seus efeitos obrigavam Juliano a parar a cada cinco minutos, com uma respiração extremamente ofegante, tentando capturar o máximo de oxigênio possível. Alcançar o cume estava se tornando uma verdadeira tortura, com seus pensamentos focados apenas em manter a consciência dos fatos. Por volta das 13h, Juliano finalmente chegou ao cume do Monte Aconcágua, a uma altitude de 6.959 metros acima do nível do mar. Além do francês, havia mais quatro montanhistas americanos lá, todos aparentemente em boas condições. Juliano descansou um pouco, gritou (chamando a atenção de todos) e começou a tirar fotografias. O local era deslumbrante, assim como toda a Cordilheira dos Andes. Do cume, ele pôde contemplar todos os outros picos próximos ao Aconcágua. No entanto, ainda restava a descida.
Logo após descer do cume, Juliano encontrou-se com o espanhol Henrique, que havia estado com eles desde Plaza de Mulas. Henrique informou a Juliano que Marcelo havia descido pelo Gran Acarreo com a ajuda de outros montanhistas. A descida de volta para Nido de Condores foi extremamente cansativa e levou cerca de 6 horas. No caminho, Juliano encontrou um carregador que lhe informou que Marcelo estava bem e na barraca. Devido à demora na descida, Juliano encontrou novamente o espanhol, e eles chegaram juntos em Nido de Condores. Marcelo estava deitado na barraca, Juliano fez um alongamento, tomou uma sopa e descansou.
Em 4 de janeiro, Paulo chegou ao acampamento de Nido de Condores e se juntou novamente ao grupo. Em consenso, eles decidiram descer e dormiram em Plaza de Mulas no mesmo dia.
No dia 5 de janeiro, o grupo desceu até Confluência, acompanhados pelo grupo espanhol, em aproximadamente cinco horas, onde passaram a noite. No dia 6 de janeiro, em Confluência, eles encontraram Beto, de Florianópolis, com quem trocaram várias informações e tiveram uma experiência agradável. No final da tarde, eles desceram para Puente del Inca, onde passaram a noite.
No dia 7 de janeiro, às 11h, o grupo partiu de ônibus para Mendoza e, no mesmo dia, seguiram para Santa Fé. No dia 9 de janeiro de 1998, eles chegaram em Caxias do Sul, concluindo a jornada de volta. A partir do dia 12 de janeiro, iniciaram-se as reportagens de divulgação do projeto, compartilhando suas experiências e conquistas. Os membros da expedição agradeceram especialmente aos patrocinadores UCS – Olimpíada 2004, Cia FIOFORTE, Pranadar e à Associação Caxiense de Montanhismo, bem como aos 12 apoiadores que foram de extrema importância para a realização do projeto.
*Participaram da expedição os associados Juliano Perozzo, Luis Marcelo Rodrigues e Paulo dos Reis.
Relato originalmente publicado no Informativo Crucks de Fevereiro de 1998.